17 de jun. de 2016

As Ocupações, a “normalidade” e a ordem das coisas

 Cristóvão de Mendoza, Caxias do Sul, RS
















                                                                                         por Rafael José dos Santos


Os discursos contra as Ocupações das escolas públicas apresentam-nas como episódios de desordem: algo que está ordenado, ajustado e estável subitamente desordena-se, desestrutura-se, subverte-se.

Tudo é dito como se a Educação e o espaço escolar vivessem o melhor momento de suas histórias: salários dignos aos professores e aos funcionários, boas instalações e, sobretudo, ambientes propícios ao exercício da cidadania, nos quais os processos de ensino-aprendizagem sejam prazerosos e envolventes, seduzindo os estudantes, apaixonando os professores.

Entretanto, não é essa a ordem das coisas, daí vem o incômodo daqueles que se preocupam apenas com a escola como lugar para deixar os filhos, como se ela fosse um depósito, ou daqueles que se preocupam com os dias letivos e os conteúdos, como se isso, por si só, garantisse a qualidade na Educação.

Salvo exceções daqueles que lutam permanentemente pela Educação, as comunidades escolares acomodaram-se em uma espécie de pacto de imobilidade, ritualizado em um cotidiano burocrático. Essa é a ordem que as Ocupações subverteram e desacomodaram. Ocupantes, professores grevistas, funcionários, familiares e membros das comunidades que apoiam o movimentam transformaram-se em alteridades insuportáveis, pois revelam aquilo que não pode aflorar sob o risco de chegarmos à conclusão de que, sob a ordem, jaz uma Educação moribunda que sobrevive respirando por aparelhos.

Como acontece sempre que a alteridade nos desacomoda, resistimos a ela insultando-a, discriminando-a, este é o mecanismo subjetivo das intolerâncias. Assim, estudantes são insultados pelos professores (que deveriam aprender algo com eles), apoiadores são ofendidos por estarem dando suporte a um movimento no qual acreditam.

É sintomático o uso negativo da expressão “- Os estudantes invadiram a escola”. A ideia de invasão supõe a ocupação de um espaço que não pertence ao invasor. Ora, se não pertence aos estudantes, a quem pertence?

Adoraria ouvir que estudantes, professores, pais, mães e comunidade invadiram as escolas, ocuparam-nas, transformaram-nas em espaços de aprendizagem efetiva, de diálogo (e não de agressões físicas com teasers e barras de ferro).

Estive em uma escola ocupada, vi a organização e a autogestão praticada pelos estudantes, vi seus debates, ministrei uma oficina e uma aula livre. Vi as atividades artísticas, outras aulas, cheguei a ver uma estudante com uma check list de segirança verificando as instalações de uma escola e, inclusive a validade (vencida) de extintores de incêndio.


Àqueles que se negaram a conhecer as Ocupações, a conversar face a face com estudantes digo apenas que perderam a oportunidade de aprender, mas sobretudo reaprender a indignar-se e desacomodar-se, assumindo junto com eles a responsabilidade efetiva por uma educação melhor.

Lênin sim!

(Rafa) Tatiana Dias e Rafael Moro Martins, autores do artigo " ELOGIAR DITADORES É A MELHOR MANEIRA DE A ESQUERDA CONTINUAR ...